
Teresa, mãe de dois filhos, vem à consulta questionando se o filho mais novo, o Martim, terá algum problema. O facto de aos 15 meses não dizer uma palavra de forma perceptível, mal se sentar sem apoio, não gatinhar ou nem pensar em colocar-se em pé, foram até então atribuídos ao excesso de preguiça e a grandes parecenças com o irmão mais velho, o Manuel, um rapaz saudável, agora com 9 anos, cujo click foi tardio.
Os primeiros anos, nos quais são vividos inúmeros processos de maturação do sistema nervoso central, são fundamentais para o pleno desenvolvimento das potencialidades da criança.
O desenvolvimento normal pressupõe uma sequência previsível baseada na aquisição de uma série de competências funcionais. No entanto, o ritmo de desenvolvimento seja ele motor, cognitivo ou da linguagem é individual e, por isso, susceptível a variações de criança para criança. A ausência de estímulo adequado nos primeiros anos de vida da criança pode constituir um factor extremamente prejudicial para o seu desenvolvimento.
Quando falamos em estimulação precoce, referimo-nos ao desenvolvimento das capacidades da criança de acordo com a fase de desenvolvimento em que se encontra. Importa referir que a estimulação é relevante para qualquer criança, quer se verifique ou não um atraso de desenvolvimento. Para que a criança progrida no seu desenvolvimento é necessário estimulá-la a experimentar novas coisas e guiá-la para que vivencie novas situações que propiciem o desenvolvimento físico, cognitivo, emocional e, também, social.
Todos os pais vivem com um conjunto de inquietações, questionando-se frequentemente “porque será que aos 13 meses a única palavra que a minha filha diz é ‘popó’ e quando quer alguma coisa apenas aponta, fazendo-nos ter de adivinhar os seus desejos?”. No que à linguagem diz respeito, importante veículo de comunicação e aprendizagem, a criança precisa sentir necessidade de falar, pelo que mesmo que os pais saibam exatamente o que deseja, não devem atender aos seus desejos quando ela tenta comunicar apenas através de gestos. Situações que fazem parte da rotina diária, como a hora do banho e da alimentação, brincar, passear, podem e devem ser aproveitadas para estimulá-la, dizendo o nome e as funções dos brinquedos, objectos, partes do corpo ou alimentos.
Para os pais, um dos maiores desafios consistirá em encontrar o ponto de equilíbrio. Qual a dose certa de estimulação? Como é que os pais podem saber se estão a estimular pouco ou se estão a ir longe demais? É importante encontrar um equilíbrio que as crianças consigam tolerar. Por exemplo, pais que enfatizam fortemente a fala podem não estar conscientes da pressão que exercem para que o filho fale. Se cada vocalização da criança for seguida de um reforço tão tenso e de adições de sons complicadas, pode levar a que a criança “fuja” às expectativas tensas dos pais, optando pelo silêncio em vez de querer, naturalmente, explorar a linguagem.
A família deve ter presente as características das etapas do desenvolvimento infantil e constitui o palco principal de actuação da criança. Qualquer que seja o contexto é hoje uma evidência que as crianças aprendem ao longo de todo o dia, através das interacções repetidas e das oportunidades de aprendizagem que partilham com a sua família, pelo que a criança aprende de forma mais eficaz quando os momentos de aprendizagem são integrados nas actividades de rotina diária.
Em situações em que se verifica que a criança não recebeu a atenção e estímulo necessários e adequados às suas necessidades, verificando-se um comprometimento no seu desenvolvimento, a estimulação precoce assume um papel essencial. As dificuldades que a criança possa manifestar ao nível do desenvolvimento motor, cognitivo e da linguagem podem condicionar profundamente a sua capacidade para explorar o meio ambiente.
Com imaginação e orientação, podemos adaptar brinquedos, jogos e outros materiais, criando um ambiente estruturado que estimule o funcionamento da criança, tendo em conta as suas características.
Filipa Tinoco – Psicóloga Educacional
CADIn – Neurodesenvolvimento e Inclusão
Texto publicado pelo Público a 02/02/2016
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