2023/08/13 – FECHADO PARA FÉRIAS!

Os meses de verão são sinónimos de férias grandes para muitos de nós.

Sejam poucos ou muitos dias, perto de casa ou mais longe, com ou sem crianças, a generalidade das pessoas associa férias a descanso e lazer e espera quase um ano pelos meses de verão como a oportunidade perfeita para trocar as voltas aos dias, que se não estivermos atentos, correm o risco de se atropelarem uns aos outros pelo resto do ano fora. Andamos todos esgotados e o desejo de parar, de desligar a ficha, de desacelerar, fala mais alto que nunca.

Sou daquelas pessoas que acha que nunca é de mais falar e pensar nas férias. Primeiro porque elas parecem cada vez mais curtas e, segundo, porque muito do que acontece nas férias tem aquele efeito retroativo de permanecer connosco, às vezes, para sempre – aquela magia que não sabemos bem explicar das vivências e dos momentos bem passados, mais devagar.

Tenho uma fé inabalável no poder de crescimento que as férias grandes podem proporcionar, sobretudo aos mais jovens. De facto, as férias podem ser muito terapêuticas e, deste ponto de vista, são o espaço onde podemos pôr em ação e pensamento muito do que que foi trabalhado durante um ano letivo e terapêutico.

A prova disso é que, no regresso às rotinas, as crianças parecem mais crescidas do tempo de brincadeiras, e os jovens trazem uma atitude e um olhar marcados por algo que os mudou lá dentro. Consolidam as aprendizagens do ano letivo, e as conquistas de um ano terapêutico mas, sobretudo, enriquecem de experiências e memórias todos os meses que estão por vir, como se de novo se enchesse um grande reservatório interno do tempo passado a engonhar e a engendrar o que não lembra a mais ninguém.

Uma palavra de reconhecimento para sublinhar que deixar a terapia nas férias pode ser sentido como um desafio por muitos para quem a oportunidade de partilhar preocupações, receber apoio e orientação regular são estruturantes. O receio de interrupção do processo terapêutico, e os efeitos que podem ter no progresso alcançado, podem gerar inseguranças e receios que são naturais e que podem ser pensados e preparados em conjunto no espaço terapêutico antes de ser sentida esta ausência.

E uma palavra também aos adultos para relembrar que o nosso corpo não tem um botão on/off e a forma como vivemos ao longo do ano determina muita da nossa capacidade de aproveitar os momentos de pausa. E se já deu por si a pensar que tem de aproveitar as férias ao máximo, relembro que não existe uma fórmula para tirar o melhor proveito dos dias de férias, pelo que, mais do que aquilo que elas deveriam ser, permitam-se fazer o melhor tendo em conta onde, como e com quem estão.

As palavras de Greg Garrad (2004) “abranda o ritmo, e a paisagem muda” (slow down, and the landscape changes) pode ilustrar bem esta sensação: de que o que é percebido e integrado internamente em nós terá uma qualidade muito diferente quando nos distanciamos da rotina. A paisagem externa tem a capacidade de mudar, porque cá dentro criamos espaço para organizar e ligar as emoções aos pensamentos e atingir alguma clareza mental do que ficou em suspenso, só por um bocadinho, tarefa quase impossível na urgência diária em que todos vivemos.

Por isso, quando estamos com os nossos filhos de férias, estamos a apoiar os nossos impulsos de exploração (também interior) e de descoberta do mundo, e os momentos de lazer podem proporcionar um contexto rico de aprendizagens carregadas de interação social, física e sensorial. É o momento de estender ao sol aquilo que foi vivido e aprendido “à pressão”, de fazer sair e encorajar o explorador que todos temos cá dentro, e de organizar as ideias, sem pressa e com tempo, de tentar algo diferente, de fortalecer os laços familiares e as relações.

Seja um passeio de um dia ou grandes férias, é importante iniciar essas viagens para depois voltarmos todos à casa de partida. O jogo recomeça e as estratégias voltam a ser implementadas, e com elas as rotinas diárias dos exercícios e do dia-a-dia, de agenda na mão.

Que se permitam aos adultos e aos mais jovens um pós-ano de trabalho de verdadeiro descanso por tudo o que foi feito e ao qual muitas vezes não se dá o devido valor.

Patrícia Rato – Psicóloga Clínica
CADIn – Neurodesenvolvimento e Inclusão
Texto publicado pelo Público a 13/08/2023

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